Desde a eclosão da Aids, em 1981, a expressão "HIV-positivo"
se transformou quase que em uma sentença de morte. A presença do HIV em
um organismo significava que, mais cedo ou mais tarde, ele adoeceria de
Aids. Mas... e se o vírus for inocente? E se ninguém precisasse temer o
contágio e nem, por causa disso, tivesse que usar camisinha como uma
obrigação, nem tomar drogas pesadas como o AZT, disparadas contra o
vírus como a única alternativa de salvação? Essa tese polêmica — ou
simplesmente insana na opinião de muitos especialistas — é defendida
pelo cientista que mais entende hoje dos vírus da categoria do HIV,
chamados de retrovírus. Trata-se do bioquímico alemão, naturalizado
americano, Peter Duesberg, da Universidade da Califórnia, em Berkeley.
"Peter é extraordinário e brilhante", diz a seu respeito o seu maior
oponente, o virologista americano Robert Gallo, do Instituto Nacional do
Câncer (INC). (Gallo descobriu o HIV e é o autor da tese de que é o
vírus que causa a Aids.) Duesberg concordou em dar esta entrevista à
Super depois que o presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, em abril,
anunciou que poderia suspender, em seu país, o tratamento da Aids por
meio de drogas anti-HIV, não só por seus efeitos colaterais deletérios,
como por haver dúvidas sobre sua eficiência no combate à doença. O
anúncio teve o efeito de um terremoto. Pela primeira vez se deu atenção a
Duesberg e a mais uma centena de pesquisadores que inocentam o vírus,
entre os quais o bioquímico americano Kary Mullis, da Universidade da
Califórnia, Prêmio Nobel de Química de 1993. A seguir, entenda por que
eles não acreditam que o HIV seja o vilão da história.
Super – Por que você não aceita a teoria de que a Aids é causada por um vírus, o HIV?
A Aids não é compatível com os critérios usados para definir uma
doença como infecciosa — isto é, causada por microorganismos. Para
começar, todas as infecções levam ao contágio e são comumente
transmitidas para quem trata os pacientes. Não se conhece um único
médico ou enfermeira que tenha contraído Aids dessa maneira. No total,
desde que a Aids foi diagnosticada há 20 anos, mais de 750 000 casos já
foram registrados nos Estados Unidos. O fato de não ter havido a
contaminação de um médico ou uma enfermeira sequer demonstra que a Aids
não é contagiosa.
Mas a Aids não está se espalhando pela população por contágio?
Não. As doenças infecciosas se alastram mais ou menos por igual por
toda a população. É o que se vê, por exemplo, na poliomielite, na
varíola, na hepatite etc. Em vez disso, tanto nos Estados Unidos quanto
na Europa, a Aids é uma enfermidade predominantemente masculina: até 85%
dos pacientes são homens. Como explicar a baixa incidência no sexo
feminino? E não é só isso: quase 70% dos pacientes masculinos são
homossexuais usuários de drogas, o que torna a distribuição da doença
ainda mais desigual, mais restrita a um segmento específico da
sociedade.
Então, qual seria o papel do vírus?
O HIV não se encaixa nos critérios estabelecidos. Nenhum outro vírus
tem o comportamento que se atribui a ele. Enquanto todos os vírus
conhecidos causam doença em alguns dias ou semanas após a infecção, o
HIV demoraria até dez anos para provocar efeito. É um paradoxo sem
explicação. Na verdade, essa demora no aparecimento do mal
é característica das doenças associadas às drogas. O câncer de pulmão
surge de dez a 20 anos depois que se começa a fumar, e a cirrose, 20
anos depois de começar a beber.
Até que ponto essa analogia é importante para entender a causa da Aids?
Ela mostra o quanto é duvidoso que o HIV seja a causa da Aids. Se ela
fosse de origem viral, deveria ter seguido um de dois caminhos
possíveis: ou teria sido controlada assim que os pacientes
desenvolvessem imunidade a ela, ou teria explodido, como previram
erroneamente os cientistas americanos. Mas o que aconteceu foi algo
completamente diferente: ela está associada a um estilo de vida, da
mesma forma que o câncer de pulmão predomina entre os fumantes e, como
ele, continua confinada a uma pequena parcela da população.
Então, a causa da doença seria um comportamento...
A hipótese que nós defendemos é que a Aids é uma epidemia química,
não contagiosa, provocada pelo uso persistente de drogas nos Estados
Unidos e na Europa, e pela má nutrição (a falta de nutrientes causa
problemas químicos, tanto quanto as drogas), na África.
Como se explicam as fotos ou filmes que mostram o HIV infectando as células?
O fato de um vírus estar presente em um paciente não é suficiente
para provar que ele seja a causa da doença. Especialmente se a doença
não é contagiosa. Na verdade, em sua grande maioria os vírus são
"passageiros" inofensivos do organismo humano e nunca causam doenças.
A hipótese da causa química tem sido estudada de uma forma adequada, na sua opinião?
Claramente não. Ao contrário, ela tem sido censurada, suprimida e
privada de verbas públicas. Os seus proponentes são intimidados e
marginalizados.
Você alega que os tratamentos disponíveis para a Aids não ajudaram ninguém até hoje. O que o faz pensar assim?
Primeiro, as terapias são direcionadas contra o vírus e ele não causa
a Aids. Segundo, como as drogas utilizadas prejudicam o sistema de
defesa do organismo (como se diz que o HIV faz) elas são Aids por
prescrição médica. Receitar AZT, por exemplo, é como receitar a doença.
Como se explica que o jogador de basquete americano Magic
Johnson esteja em tão boa forma, embora tenha tido Aids e tomado o AZT?
Você está enganado: Johnson tomou AZT por alguns meses apenas, dez
anos atrás. Depois disso nunca mais. E é por isso que tem boa saúde
agora. O HIV é inofensivo, mas as drogas anti-HIV são mortais: Johnson
é a prova viva disso.
Você acredita que uma pessoa saudável poderia injetar o vírus em si mesma sem risco de ter Aids?
Sim. Isso já acontece. De acordo com a Organização Mundial de Saúde
33 milhões de pessoas, atualmente, são HIV-positivas, mas menos de dois
milhões desenvolveram a doença desde que ela é conhecida. Portanto, há
31 milhões de pessoas infectadas e completamente saudáveis no mundo —
entre as quais Magic Johnson.
Você faria essa experiência?
Eu já me dispus a isso, desde que o objetivo seja fazer pesquisa —
uma investigação financiada por dotações adequadas e com liberdade para
publicar os resultados em revistas especializadas. Eu sou um cientista,
não um apostador.
Você acredita que o grupo dos chamados "rebeldes da Aids", do qual você faz parte, pode passar a ser ouvido daqui para a frente?
Penso que o nosso maior aliado é o fracasso da hipótese de que o HIV
cause Aids. As pesquisas nessa linha não conduzem à cura, não previnem e
nem explicam a doença, a despeito de todos os esforços já feitos em
termos de capital e de recursos humanos por mais de 16 anos. A
incapacidade de produzir resultados é a marca registrada do fracasso.
Isso, mais a simples lógica dos nossos argumentos, refutarão a hipótese
corrente mais cedo ou mais tarde. Da mesma forma que Galileu, mesmo que
depois de 400 anos, acabou convencendo até o papa de que a Terra gira em
torno do Sol. (Só em 1983 a Igreja admitiu que errou ao condenar
Galileu.)
fdieguez@abril.com.br
O HIV é inofensivo. Mas as drogas anti-HIV são mortais